
Insultos repetidos, apelidos pejorativos, gozações públicas e exclusões planejadas derrubam a autoestima de crianças e adolescentes e comprometem a aprendizagem. Quando a agressão é intencional, repetida e há desequilíbrio de forças (física, social ou psicológica), estamos diante de bullying. O conceito ajuda a diferenciar conflitos pontuais — que também exigem mediação — de situações em que um aluno é sistematicamente alvo de hostilidade. Reconhecer cedo esse padrão protege a saúde emocional e reduz impactos acadêmicos.
Tipos mais frequentes de bullying
Verbal: xingamentos, humilhações, ameaças e apelidos que expõem características físicas, sotaque, desempenho escolar ou contexto socioeconômico. A ferida não aparece na pele, mas atinge a identidade e o senso de pertencimento.
Físico: empurrões, chutes, “rasteiras”, cusparadas, beliscões e danos a materiais escolares. Muitas vezes é justificado como “brincadeira”, porém a repetição e a intenção de ferir caracterizam a violência.
Psicológico: intimidação, perseguição, ridicularização pública e chantagem emocional. O agressor mina a autoconfiança da vítima, que passa a se culpar e a evitar espaços comuns (quadra, pátio, refeitório).
Relacional (ou social): exclusão planejada de grupos, isolamento em atividades, proibição de aproximação e boicote de amizades. É uma forma silenciosa, difícil de flagrar, mas com efeitos duradouros sobre habilidades sociais.
Material: furtos, “sumiço” de pertences e destruição de cadernos, estojo, uniforme ou lanche. O objetivo é controlar pela perda e pelo medo.
“Quando a exclusão vira rotina, a criança aprende a se encolher para não ser vista. É um sinal de alerta que pede intervenção rápida e acolhedora”, afirmam educadores do Colégio Senemby, de Caieiras (SP).
Cyberbullying e seus efeitos
Na esfera digital, o assédio ganha alcance e velocidade. Cyberbullying inclui criar perfis falsos para atacar colegas, espalhar boatos em grupos de mensagens, publicar montagens humilhantes, vazar fotos sem consentimento, marcar a vítima em conteúdos ofensivos ou promover “linchamentos” virtuais. Como a exposição não tem horário e pode envolver muitos observadores, o dano emocional tende a ser maior. A vítima revive a agressão a cada curtida, comentário ou compartilhamento e pode desenvolver ansiedade, medo de sair de casa e queda brusca no rendimento escolar.
Cuidados práticos ajudam: configurar perfis como privados, limitar quem pode comentar, salvar evidências (prints com data e hora), não responder a provocações e procurar um adulto de confiança para intervir. Em situações graves, a orientação é registrar boletim de ocorrência e acionar canais de denúncia das plataformas.
Sinais de alerta para pais e estudantes
Mudanças repentinas de comportamento costumam anteceder a revelação do problema. Fique atento a:
- Evitar ir à escola, inventar sintomas para faltar, pedir para trocar de sala ou de trajeto.
- Queda no desempenho, perda de foco, medo de apresentar trabalhos, silêncio em atividades coletivas.
- Marcas físicas sem explicação coerente, materiais danificados ou desaparecidos com frequência.
- Alterações no sono e apetite, dores de barriga ou de cabeça recorrentes, choro fácil ou irritabilidade.
- Isolamento social, falas autodepreciativas, frases como “ninguém gosta de mim” ou “sou um peso”.
- Aprensão ao olhar o celular, apagar rapidamente a tela, sair de grupos on-line, bloqueios e trocas constantes de senha.
Abrir espaço para conversa é decisivo. Em vez de perguntas gerais (“foi tudo bem?”), prefira perguntas específicas e acolhedoras: “Alguma situação te deixou desconfortável hoje?”, “Teve alguém pegando no seu pé?”, “O que eu posso fazer para te ajudar agora?”. Evite culpar a criança por não “se defender”; o foco é proteger e interromper a violência. “Escutar sem julgamento e validar o sentimento é tão importante quanto a providência disciplinar. A vítima precisa sentir que não está sozinha”, reforçam os educadores do Colégio Senemby.
Como agir e quando buscar ajuda
1) Acolhimento imediato. Diga claramente que ninguém merece ser maltratado e que você vai ajudar. Nomear o que aconteceu — “isso é bullying” — organiza o sentido do vivido e diminui a culpa.
2) Registrar os fatos. Anote datas, locais, nomes de envolvidos e testemunhas. Guarde fotos de danos a materiais e, no caso do cyberbullying, salve capturas de tela com data e hora.
3) Comunicar a escola. Procure coordenação, orientação educacional ou direção para apresentar o relato. A escola deve investigar, garantir segurança e estabelecer medidas educativas e disciplinares. Informe se a criança teme retaliações e negocie uma estratégia de proteção (mudança de lugar na sala, supervisão em recreios, acompanhamento de um funcionário em deslocamentos internos, por exemplo).
4) Reorientar o uso de tecnologia. Ajuste privacidade, bloqueie agressores, reporte conteúdos e incentive pausas digitais. Acompanhe de perto os grupos de mensagens em que seu filho está inserido.
5) Cuidar da saúde emocional. Diante de sinais persistentes de ansiedade, tristeza ou retraimento, busque apoio psicológico. A terapia trabalha autoestima, habilidades sociais e estratégias para lidar com conflitos.
6) Evitar confrontos diretos. Não estimule que a vítima “pague na mesma moeda”. Confrontos podem escalar a violência e expor a criança a riscos.
7) Acompanhar depois da denúncia. Pergunte diariamente como a criança está, monitore se as medidas surtiram efeito e mantenha a escola informada sobre avanços ou recaídas.
O arcabouço legal brasileiro reconhece o problema. A legislação que trata da intimidação sistemática (bullying) orienta instituições a prevenir, identificar e enfrentar casos, inclusive com ações educativas, formação de profissionais e responsabilização de condutas graves. Conhecer esses direitos fortalece famílias na busca por soluções efetivas.
Outras formas que exigem atenção
Certas variantes exigem respostas ainda mais firmes:
Bullying preconceituoso: ataques motivados por cor/raça, origem, religião, deficiência, gênero ou orientação afetivo-sexual. Além do acolhimento à vítima, é essencial trabalhar valores de respeito e diversidade com toda a turma.
Bullying sexual: comentários sobre corpo, “brincadeiras” de conotação sexual, apalpadas, beijos forçados, exposição de imagens íntimas. A situação deve ser tratada com máxima seriedade e sigilo, acionando protocolos de proteção.
Assédio moral escolar (moral): rebaixamentos públicos e humilhações persistentes que corroem a dignidade. O alvo passa a acreditar que “merece” a violência; por isso, o suporte terapêutico e a resposta institucional são indispensáveis.
Bullying não é “fase”. É violência que se repete e produz cicatrizes emocionais e acadêmicas. Identificar o padrão — intenção, repetição e desequilíbrio de forças — permite agir com rapidez. Compreender as modalidades mais comuns (verbal, física, psicológica, relacional e material), o impacto do cyberbullying e os sinais de alerta em casa e na escola orienta decisões concretas: acolher, registrar, comunicar, proteger e acompanhar.

